quinta-feira, 9 de junho de 2011

O Trabalho em Portugal (parte 04)

Facto #04


Dou comigo a olhar, sorrateiramente, para um colega que está na mesa em frente deste "open space" imenso. Sinto que estou a ser observado ou, pelo menos, sinto que alguém está a olhar para mim enquanto trabalho. Sinto-me incómodo e tento confrontá-lo cara a cara, nos olhos.


Quando o faço dou de caras com este meu colega a olhar para o "infinito". Olhos perdidos e movimentos parados. E tenho uma sensação de "dejá-vú"...


É que isto acontece várias vezes. Este homem pára tudo e fica assim durante (e não estou a exagerar...) pelo menos uma hora. Já pensei se não estará a fintar o destino ou, simplesmente, a dormir acordado. A segunda possibilidade parece-me muito mais plausível.


São 15h e ele está nisto há uns 20 minutos. Sei perfeitamente que dentro de, aproximadamente, uma hora vai levantar-se. Vai pegar no seu casaco, colocado estrategicamente nas costas da cadeira e, como se já estivesse atrasado para um qualquer encontro importante, vira-nos as costas e diz num murmúrio quase inaudível: ..."´té manhã..."


E fico a perguntar-me como é possível um homem feito, com 30 anos de trabalho, passar as tardes assim. O que é que ele diz à mulher quando chega a casa? Que está cansado? Que não aguenta mais esta canseira de trabalho?


E se fosse o único a ter este tipo de atitude eu até podia ter alguma compaixão, mas não. O pior deles todos está lá atrás, bem lá no fundo. Leva os dias inteiros sem que lhe chegue uma única tarefa (verdade seja dita que também nunca o vi procurar...) e tenta, em vão, entreter-se as 8 horas diárias de suposto e obrigatório "trabalho". E como é que ele faz isso, perguntam vocês?


Joga o mais aborrecido jogo que existe à face deste planeta: vulgarmente conhecido como o Solitário do Windows. Uma e outra vez. E depois um pouco mais. Até serem 16h30. Aí levanta-se e vai à vida dele, que já se faz tarde. Que raio de vida. Que raio de trabalho que esta gente não tem e acha que tem. Há quanto tempo dura isto? Eu só cá estou à um ano, e esta gente leva décadas nesta morte lenta?


E assim se trabalha em Portugal.

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